Casa da Mangueira, Rio de Janeiro.

Em março de 2018, visitei a Escola Casa da Mangueira. A Escola se localiza em uma bonita casa em Botafogo, recém reformada. A idealização da Casa da Mangueira surgiu a partir de 4 mães que já apresentavam afetos e interesses pela educação, sendo duas psicólogas e duas pedagogas. Em 2015, elas se juntaram para construir um projeto educacional diferente. Em 2016, o projeto realizou uma parceria com o Grupo de Mães de Botafogo e recebeu 20 crianças. Em 2017, haviam 40 crianças. Em 2018, a Casa da Mangueira recebia cerca de 70 crianças.
Até 2017, este projeto chamava-se Mangueirinha e acontecia no Solar das Mangueiras. Em 2018, o projeto se estabelece oficialmente como escola, abrindo suas portas para crianças de até 7 anos. A escola se propõe a abarcar o Fundamental I: são as atuais crianças do 1º e 2º ano escolar que irão inaugurar as próximas séries até o 6º ano. Diante do número de salas (5), dividem-se as atividades de educação infantil para as tardes e Fundamental I para as manhãs (atualmente até 6 anos), o que justificaria a ausência de uma escola de tempo integral.
Para nos contar sobre a filosofia da escola, a educadora e uma das fundadoras da escola, Julia, nos apresentou um belíssimo bordado de uma árvore. Em cada parte da árvore, haviam escritos que simbolicamente representavam os valores da escola. De antemão, podemos entender o bordado a partir de uma analogia com uma pedagogia artesanal e orgânica, a partir da qual cada peça é tecida de um modo diferente, único e singular.


Na raiz da árvore, encontramos escritos os pilares da escola. Conversamos sobre a “preservação da infância”, o respeito ao tempo e a história de vida de cada criança. Entende-se que não há um tempo certo de andar ou de tirar as fraldas, por exemplo. As educadoras realizam reuniões individuais com as famílias para conhecerem a história da criança desde a gestação, parto e demais singularidades. Acredita-se na liberdade aliada a um limite/contorno, não sob a forma de autoridade, mas a partir do conhecimento acerca da criança.
Em termos de inspiração teórica, a Casa da Mangueira se considera construtivista. Defendem que para a criança ser autora do seu processo, descartando a ideia de métodos únicos e verdadeiros pré-determinados. Convoca-se inspirações de diversos educadorxs: Montessori nos ensina sobre os processos de autônoma da criança e uma aprendizagem que não ocorre por uma ordem um superior; assim como sobre os móveis adaptados às crianças e os brinquedos acessíveis às idades
A Pedagogia Waldorf , por sua vez, é valorizada pela importância em relação ao ritmo e rotina da escola, a partir dos ritmos dos anos (as estações!), uma vez que a organização interna traz segurança para o ambiente. Há uma vivência da magia estimulada por esta pedagogia, potencializando os processos de criatividade das crianças.
Paulo Freire é tido como um grande guru por meio de seus ensinamentos sobre autonomia, entendendo que educação é política. As famílias da escola foram juntas na manifestação referente à morte da Marielle Franco, por exemplo A política também se exerce a partir da possibilidade de desconstruir papéis de gênero enrijecidos. A escola atualmente possui 4 bolsistas, havendo uma preocupação em como cuidar desse encontro social e cultural, promovendo espaços de diversidade.


A escola também faz parte do movimento das Cidades Educadoras. Um dos projetos parceiros é o “Carona a Pé”, no qual tenta-se estabelecer uma relação de aprendizagem entre as crianças e a comunidade a sua volta. Um exemplo disso, é estimular as crianças a irem a pé para a escola juntas, criando vínculos com os estabelecimentos no caminho. Assim, entra-se em contato com a prefeitura para que o semáforo perto da escola seja mais lento, permitindo a passagem das crianças; ou solicita-se aos restaurantes no caminho que abram suas portas se uma criança precisar ir ao banheiro ou beber uma agua, ou seja, cria-se uma rota diária na qual a criança pode conhecer o seu bairro e aprender com ele a partir de trocas e encontros.
A abordagem Pinkler para bebês também é muito valorizada. Entende-se que para estarem no coletivo, a criança precisa de interações com uma mesma pessoa de referencia. Uma educadora se torna responsável por 3 crianças e será ela a referência que irá sempre trocar as fraldas, dar o lanche, valorizando essas tarefas como sendo momentos de extrema importância afetiva. Pouco a pouco, os demais adultos vão sendo introduzidos, podendo perguntar “como você gosta que troque suas fraldas?”.
O tronco da arvore bordado seriam os valores que sustentam a escola, quem carrega a energia da raiz para as folhas. No tronco, conversamos sobre o espaço físico também ser educador. Deixar massinha e observar as crianças se encontrarem com estes materiais, por exemplo, também é uma forma de educar, dispensando uma intervenção a todo momento.


A equipe é outro componente deste tronco. Esta deve estar sempre afinada, entendendo que a escola é feita por seus professores. Diante disso, destaca-se o cuidado com os educadores, o olhar entre eles. A família também está no tronco. Familiares “especialistas” são chamados para contribuir na educação, por exemplo, através de um responsável que é biólogo ou cozinheiro. No mais, as famílias ajudam a construir as festas da escola. O hall de entrada da escola se configura enquanto um espaço de trocas e socialização entre as famílias.
Na copa da arvore estão os frutos. Liberdade e segurança (física e emocional) caminham juntas. Criatividade, diversidade, afeto e ritmo também se fazem presentes. A cultura popular, expressa através do coco, ciranda, jongo e maracatu, também compõe a rotina escolar. Quando se mudaram para a nova casa, as crianças fizeram um cortejo do Solar das Mangueiras até a casa nova pedindo “licença” para esta nova fase, o que foi simbolizado depois com a Folia de Reis.
A escola hoje é dividida por idade e cada turma possui umx educadorx: grupo 1, grupo 2, grupo 3, grupo 4 e grupo 5. Cada grupo corresponde à sua respectiva idade. Cada idade possui uma sala e um cronograma de atividades diárias. Há 15 crianças por turma. As crianças têm a possibilidade de escolher o que gostariam de estudar, a partir de uma pedagogia por projetos. Passa-se um mês observando os interesses delas e a partir de temas levantados, criam-se projetos.
No mais, professorxs especialistas estão na escola todos os dias. Segunda feira é x educadorx de corpo; terça-feira de artes; quarta-feira de jardinagem; quinta-feira inglês (para o Fundamental I) e sexta-feira música. O lanche escolar é feito cada dia por uma turma e oferecido para toda a escola.


Sobre adaptação, esse processo varia muito de acordo com cada criança. Na primeira semana, costuma acontecer o encontro da criança com o espaço por cerca de 2h. É possível fazer uma analogia com uma criança que vai com seus familiares em uma pracinha nova brincar, conhecer o espaço, o grupo que ali frequenta. Na segunda semana, pode-se aumentar o tempo de permanência na escola. O familiar fica sentado em uma cadeira na sala. Assim, a criança tem a possibilidade de escolher brincar ou estar com seu responsável. Se ela ficar um tempo sem acessar o responsável, este aos poucos pode circular pela escola, ir ao banheiro, voltar, neste movimento sensível. Já na terceira semana, o familiar pode estar na escola, trazer um livro, trabalhar, fora da sala de seu/sua filho/filha, sendo acionado somente se for necessário. Vale frisar que este processo é único e singular e varia em cada caso.
Por fim, após esse momento de apresentação da escola, demos um passeio pelo local. Caminhamos pelas salas e nos direcionamos para o lindo jardim de fundo, onde se encontra a famosa mangueira! Ali, em meio as arvores e plantas, nos despedimos.
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