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Politeia Escola Democrática. São Paulo, SP.

Em abril de 2017, fui recebida pelo coordenador e educador Yvan na escola Politeia. Fiquei emocionada com a sua dedicação e o seu brilho dos olhos ao falar sobre a trajetória da escola. Inicialmente, a Politeia surgiu como uma parceira da escola Teia Multicultural. Uma vez que a Teia abarcava somente a educação infantil, os alunos que saiam desta escola se dirigiam para a Politeia. Posteriormente, as escolas seguiram rumos diferentes.

A escola começou com apenas 6 crianças e hoje em dia recebem cerca de 50 estudantes. Acredita-se em uma formação politica estimulada através de assembleias, fóruns de resoluções de conflitos, rodas de conversa, entre outros dispositivos. A democracia é um ideal norteador através da participação dos estudantes em seus destinos políticos de forma equitativa, em detrimento de qualquer forma opressora e hierárquica de poder. Assim, a escola caminha para a formação de pessoas responsáveis, criticas, autônomas e com iniciativa. Baseiam-se em valores como: diversidade, liberdade com responsabilidade e sustentabilidade.

A Politeia já experimentou diversas formas de organização, desde grupos de estudos diários misturados por idades até ciclos de três anos. Em 2017, eles propuseram uma dinâmica a partir daquilo que sentiram fazer mais sentido. Havia uma única estrutura e rotina escolar para todos e todas: os estudantes podem construir, opinar, transformar, sempre juntos. Esta ideia se distancia de uma noção de liberdade na qual “cada um faz o que quer, na hora que quer”. Caso o estudante esteja insatisfeito com alguma estrutura, ele tem total espaço e direito de questionar e construir de um modo diferente, o que não implica em uma não participação das ações propostas. Retomando a ideia de democracia, a educação na Politeia convoca a participação de todos na elaboração das regras, de modo a organizar a vida em comunidade a partir do respeito e cuidado com o próximo. A escola caminha em direção ao fortalecimento de um coletivo, baseado na cooperação e solidariedade.

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Assim, a Politeia se organizava a partir  destes dispositivos:

a) Convivência:                              

- Roda de Conversa                          

- Assembleia                                

- Comissões                                  

- Fórum                                  

                                           

 b) Conhecimento

- Tutorias

- Ateliês                                             

- Laboratório

- Grupos de Estudos

- Pesquisas

A escola se divide em 5 tutorias: cada tutoria é orientada por um educador e possui uma média de 10 crianças. A tutoria é um espaço de troca, acolhimento, construção de conhecimento, fortalecimento das relações desse coletivo e acompanhamento de perto do desenvolvimento de cada criança ali presente. É um espaço livre que pode ser desenhando a partir dos desejos do tutor em conjunto com os estudantes. Estes são organizados em faixas etárias próximas, pois percebeu-se a importância das trocas em momentos similares de suas vidas. As tutorias recebem nomes de acordo com os temas elegidos no ano. No caso de 2017, o tema eleito foi filmes. Assim, cada tutoria criou um nome a partir dos interesses dos alunos. Hoje há a tutoria 1A (6,7 anos), 1B (7-8 anos), 2A (8,9, 10 anos), 2B (10,11 anos) e 3 (12-16 anos). Estas demarcações não são fixas e sim apenas possíveis faixas etárias presentes em cada tutoria. Vale lembrar que há outras atividades em grupos diversos em que todas as crianças da escola podem conviver e trocar.

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A escola possui um turno na manhã (ainda com poucos alunos, tutoria 3) e um turno da tarde (demais alunos). Há um momento em que estes turnos se encontram. Assim, os estudantes da tutoria 3 entram as 09.30h da manhã na escola (acredita-se que os adolescentes têm maior necessidade de sono) e saem as 14.30h. Já os estudantes do turno da tarde entram 13h e saem às 18h. Logo, o período de 13h as 14.30h é dedicado para atividades coletivas entre toda a escola. Às 13.15h, acontece a Roda de Conversa – momento dedicado para abertura do dia, recados e comunicados cotidianos. Após este momento, acontecem as demais atividades de convivência como, por exemplo, a assembleia.

A Assembleia é feita por todos os estudantes, educadores e funcionários, sendo o principal espaço de construção coletiva. Ali são elaboradas as regras da escola, os direitos e deveres dos indivíduos, assim como diversas propostas de ações. A assembleia é feita semanalmente e é dividida em dois momentos: na primeira meia hora, as pessoas se dividem em grupos de discussões de acordo com as propostas colocadas. Trata-se de um momento para se aprofundar nas discussões em grupos menores. Ou seja, caso você esteja interessado em participar da discussão sobre, por exemplo, o uso de tecnologia na escola e não se interesse tanto pelo debate sobre a alimentação da escola, há possibilidade de se envolver no debate que faz sentido para cada um. A partir destas pequenas discussões, são elaboradas propostas mais organizadas.

Em um segundo momento, as pautas, que agora são propostas articuladas, são expostas para os demais e acontece a votação. Neste momento, podem haver dúvidas, questionamentos e ponderações, mas é sabido que aquele tema já foi trabalhado por um grupo, tornando a dinâmica mais fluída e menos desgastante. Há um questionamento se a Assembleia deveria ser opcional ou não, pois muitos alunos consideram este momento “chato” e ficam brincando, atrapalhando a participação dos demais e se eximindo deste papel de participação.

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A escola também se organiza em “comissões” e acredita que todos os alunos devem passar por todas as comissões, de modo a circular e participar integralmente da escola. As comissões são um dispositivo de trazer a responsabilidade da construção e do cuidado do espaço escolar para cada um. As comissões são: Biblioteca (cuida da manutenção, organização e arrecadação de livros na escola, além de estimular a leitura com sugestões de livros); Reciclagem, Compostagem, Cisterna e Horta; Manutenção de Brinquedos e Jogos; Manutenção (cuidado com o espaço físico e equipamentos da escola); Financeira (analisa contas, gastos e propõe ações de economia); Cardápio (elabora o cardápio de lanches e ajuda na preparação da comida em algumas ocasiões); Ateliê de Artes e Trabalhos Finalizados (cuidado com a manutenção dos materiais e do espaço do ateliê); Fórum (resolução de conflitos entre os membros da escola).

O Fórum é uma comissão organizada por dois alunos e um educador com o objetivo de mediar os conflitos da escola. Os membros da escola que possuem algum conflito que não consegue ser resolvido entre as partes, escrevem em um mural o seu nome, quem se envolveu no conflito, o que aconteceu e aguarda um encontro marcado pelo Fórum. O Fórum convoca ambas as partes, não para achar culpados ou punir, e sim para melhorar a convivência e entender os ocorridos.

Já os dispositivos de conhecimento, além das tutorias, incluem os ateliês: ciências biológicas e humanas, matemática, português, artes e corpo. Diante do interesse e estudo por temas mais complexos, os educadores concluíram ser importante oferecer alguns conhecimentos básicos como forma de auxílio. Por exemplo, por mais que os estudantes queiram estudar determinado tema, será muito mais difícil desenvolver uma autonomia se eles não souberem ler e escrever. Assim, faz-se necessário um ateliê que possa se aprofundar na alfabetização, assim como na interpretação de texto, dentre outros assuntos que abordam a língua portuguesa. O mesmo ocorre com a matemática: por mais que um aluno queira entender sobre o sistema solar, será necessário que ele conheça alguns assuntos de matemática. A escola não acredita em um conhecimento linear e progressivo, mas pensa ser importante ter educadores especializados em determinadas áreas, de modo a expandir a compreensão dos conhecimentos. Os ateliês são divididos pelas tutorias, pois acredita-se que as idades próximas possam responder a certas demandas.

Identificou-se a importância de oferecer um espaço de aprofundamento em determinadas áreas, de modo a facilitar a própria pesquisa e estudos das crianças. Além de português, matemática e ciências (naturais e sociais), a escola considera igualmente importante o estudo e aprofundamento em artes e corpo. Os alunos possuem avaliações feitas pelos educadores ou auto-avaliações. Estas são organizadas por meio de uma sondagem para saber como está a aprendizagem do aluno sobre aquele tema de forma contínua.

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Os laboratórios de exploração são momentos em que as crianças podem escolher o que irão fazer – brincar, explorar, pesquisar – sem nenhum direcionamento dos educadores. São horários sem proposta definida, que acomodam quaisquer interesses dos estudantes.

Já nos grupos de estudos, os estudantes se reúnem a partir de temas de seus interesses. Assim, alunos de diferentes idades se juntam para explorar determinado assunto. A cada bimestre, escolhem-se novos temas. Normalmente, os diferentes educadores se dividem de acordo com a área de atuação/estudo de cada um e orientam os grupos. Ocorrem encontros durante a semana, de modo que os alunos possam se aprofundar nos temas elegidos, traçando os rumos dos estudos e os assuntos que serão abordados. Os Grupos de Estudos passam por diversas áreas de forma transdisciplinar. Na ocasião da minha visita, os alunos estavam estudando sobre refugiados. Ao final da pesquisa, a escola convidou um refugiado congolês que pôde compartilhar sua história e sentimentos com as crianças. 

Além disso, ao longo de cada semestre, as crianças participam de pesquisas individuais, sob a orientação de um educador. A pesquisa é uma forma de realização de uma autonomia e a construção de um processo singular. Uma vez escolhido o tema de sua pesquisa, a criança tem a possibilidade de explorá-lo de diversas maneiras, sendo sempre estimulada pelo educador para caminhar em direção a novos aprendizados. Assim, elas podem estudar através de livros, passeios, entrevistas, filmes, conversas, dentre tantas outras formas. Durante este processo, o estudante apresenta o trabalho aos seus pares. Em um momento intermediário, a escola convida especialistas dos temas estudados para visitar a escola e formar uma “banca de qualificação”, a fim de dar seu parecer sobre a pesquisa, assim como sugestões para serem trabalhadas pelo estudante até o final do semestre. Ao final do processo, há um dia de apresentações das pesquisas para toda a comunidade em um evento. As pesquisas podem ser apresentadas de diversas formas como apresentação digital, livro, exposição, filme, experimento, etc.

Falamos sobre o exemplo de uma aluna que quis estudar teatro. Por já estar há muitos anos na escola, a menina, sozinha, traçou seu roteiro de estudos. Disse que em um primeiro momento iria estudar a história do teatro. Depois, convidaria uma diretora para perguntar os obstáculos e desafios da profissão. Ao final, ela iria escrever a própria peça de teatro. Assim foi feito e, inclusive, os alunos quiseram ensaiar e apresentar a peça escrita por ela no semestre seguinte. Outro aluno escolheu como tema “como fazer um sabão” – ele foi na loja de sabão junto com o tutor, estudou os processos químicos e ao final, iria produzir o sabão. Outra aluna escolheu como tema os “movimentos sociais” – ela iria estudar os movimentos da história até os dias de hoje, realizando uma intervenção na escola como projeto final.

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A escola também realiza diversas saídas para fora dos muros da instituição. A cidade também é vista como espaço pedagógico, sendo importante sair em busca de aprendizado. As saídas podem reunir a escola toda, ou somente uma tutoria, quando é o caso de sair para se aprofundar em algum debate. As saídas podem acontecer em parques, museus, entre tantos outros espaços da cidade. Há um cartaz no mural da escola escrito “cartões” – Quando ocorre alguma saída e uma criança desrespeita os combinados da escola, ela ganha cartão vermelho ou amarelo. O amarelo, é uma advertência para a próxima saída. No vermelho, ela fica impossibilitada de ir na próxima saída.

Durante a semana, também há o momento das “estações” – são propostas trazidas semanalmente pelos educadores. No mês de abril, haviam propostas como: brincadeiras tradicionais, estudos sobre o pixo, teatro, canais do youtube, músicas e dança, culinária e fotografia. Os temas mudam a cada mês de acordo com interesse dos educadores e demanda dos alunos.

Em relação à “inclusão”, há uma educadora responsável que se dedica a fundo nesta temática, focando maior atenção aos alunos com necessidades especiais. Procura-se realizar um trabalho em conjunto com a família e psicólogos. Não há psicóloga da escola devido à questões financeiras. No entanto, uma tutoria assumiu a função de estudar, pesquisar e se dedicar com afinco frente as possíveis demandas destas crianças.

 

Os alunos não têm salas fixas, circulando por todos os espaços da escola. O pátio da escola está coberto de pichações. Pelo o que compreendi, há uma discussão na escola sobre o assunto: "arte: intervenção ou poluição?" – Há uma horta vertical nas paredes, assim como pequenos canteiros com placas que sinalizam o que está sendo plantado: menta, café, capim limão, cidreira, etc. Todos são responsáveis por lavar a sua louça do refeitório e há um rodizio que atua na limpeza do espaço. Enfim, agradeço a Politeia por ter me recebido com tanto carinho e acolhimento.

Para mais informações: 

http://escolapoliteia.com.br/

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